Marketing jurídico é expressão há muito tempo incorporada ao nosso vocabulário. Mas existiria mesmo um marketing jurídico? Tenho dúvidas. Acho que adotamos um pacote de ideias prontas, tiradas de manuais produzidos lá fora, onde os advogados podem falar mais abertamente sobre seus serviços. Aqui, eles têm limites para anunciar na mídia, para mostrar sua marca, falar de seus grandes casos e clientes, anunciar em redes sociais… Recentemente, um advogado foi enquadrado pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) sob acusação de que estava concedendo entrevistas demais. Se o bom marketing tem muito de liberdade, criatividade e ousadia, definitivamente não é disso que estamos falando quando pensamos em marketing no mundo jurídico aqui no Brasil.
Sei que a palavra marketing sempre causou um certo desconforto no próprio mundo jurídico, provavelmente muito menos pelo que o marketing realmente é, mas talvez pelas suas formas mais rasas e grudentas: o famoso “pague um, leve dois”, as chamadas telefônicas e e-mails não solicitados, os brindes descartáveis, ou as promoções incompreensíveis das operadoras de TV por assinatura. Mas, convenhamos, esse pacote de espertezas ao estilo Saul Goodman, o advogado picareta da série Breaking Bad, já não funciona muito bem para ninguém. Serviria ainda menos para profissionais a quem não convém adotar explicitamente uma postura de mercador. Aliás, reconheço que não estamos diante de uma unanimidade. Já ouvi de muitos jovens advogados o sonho de espalhar anúncios pelos jornais e outdoors da cidade anunciando ofertas e descontos. Alegam, com alguma razão, que sem acesso às ferramentas promocionais, a competição com as firmas já estabelecidas é ainda mais desigual. Imagine só, “duas petições pelo preço de uma”, ou “pague um HC e leve dois”…
De qualquer forma, marketing é muito mais do que isso. Todos os setores mais organizados da economia aprenderam a usá-lo para se aproximar das pessoas e ajudá-las a encontrar o que precisam. É fundamental para advogados, que precisam destacar suas habilidades em ambientes cada vez mais nivelados e competitivos. Entre dois concorrentes com as mesmas competências, tende a ganhar quem aparece mais, ou da forma mais atraente. Escritórios podem e devem se comunicar bem com seus clientes, com seus prospects e também com a sociedade.
Ok. Só não consigo fazer as pazes com a expressão marketing jurídico. Prefiro pensar simplesmente em comunicação.
Não vejo como falar em aspectos positivos dessa triste epidemia de Covid-19, mas é interessante observar o papel da comunicação nessa batalha. A tragédia sanitária nos aproximou da ciência porque é de lá que vem a solução. Mas também porque muitos médicos estão dando um verdadeiro show, emprestando sua credibilidade, seu conhecimento, sua didática e empatia para construir um ambiente de segurança, em meio a um oceano de fake news e de ações oficiais contraditórias. Boa comunicação pode ajudar a salvar vidas e, de quebra, pode tornar marcas e nomes mais conhecidos. Tenho certeza que profissionais que se envolveram de peito e coração abertos nessa luta contra a desinformação serão recompensados da melhor forma: com respeito e gratidão.
Voltando ao nosso mundo, todos podem fazer comunicação para ajudar as pessoas a viver melhor —até advogados. Temos uma sociedade de demandas jurídicas urgentes. Somos tributados de forma selvagem, tarifados além do que gastamos, temos nossos direitos mais elementares negados, registramos 50 mil homicídios anualmente. Advogados são formados para lidar com esses abusos, têm as informações e o conhecimento para ajudar as pessoas a enfrentá-los. Se há restrições para que falem de si, minha proposta é que se comuniquem pensando também nos outros. Há um mundo de possibilidades além do congestionado carrossel de egos inflados das redes sociais.
Passada a pior fase da pandemia, as pessoas e as empresas, esperemos, precisarão menos do socorro dos médicos, mas muitas vão precisar de advogados para tentar salvar seus negócios, renegociar contratos, exigir direitos trabalhistas, fazer cobranças, etc, etc. Por muitos anos vão nos perguntar o que fizemos nesses primeiros meses de 2020, que vidas tocamos, a quem ajudamos. Tenho certeza que o conhecimento dos advogados e uma estratégia de comunicação bem pensada pode ajudar as pessoas a viver melhor, levando informação correta e relevante.