A Justiça da Holanda concedeu a uma cirurgiã o direito de ver removidos do Google resultados de buscas que levavam à uma “lista negra” de médicos envolvidos em investigações de má conduta e impedidos de praticar a medicina. A médica realmente foi suspensa por negligência no pós operatório de um paciente e impedida temporariamente de exercer a profissão. Porém, após uma apelação, sua pena foi convertida em uma suspensão condicional, o que a permitiu continuar trabalhando. O caso, que foi concluído em julho e veio a público recentemente, é considerado o primeiro em que o direito ao esquecimento é aplicado em caso de negligência médica. Há vários semelhantes em discussão no Brasil. É uma grande derrota para o Google e um caso para se pensar a respeito.
Um dos principais argumentos contra a adoção de mecanismos para suprimir informações da internet, o chamado direito ao esquecimento, é o uso desse tipo de garantia para esconder o passado de corruptos e malfeitores. Essa sempre foi uma das principais críticas contra a adoção de leis desse tipo, inclusive no Brasil. Uma análise dos relatórios mais recentes produzidos pelo Google na Europa, onde a lei está valendo, ajuda a colocar o assunto em uma nova perspectiva. Foram apresentadas cerca de 750 mil solicitações para a remoção de 2,7 milhões de links. Quase 90% dos solicitantes não são pessoas públicas e um grande número de pedidos partiu de menores de idade. Políticos e pessoas com exposição pública são, como era imaginado, os principais solicitantes, mas também são os que têm a maior taxa de pedidos negados. O Google atendeu quase todas as solicitações relativas à exposição de informações pessoais, mas contemplou menos de 5% das solicitações envolvendo políticos.
O assunto é pedregoso e tem um desafio de origem: a dificuldade de se legislar em um ritmo pelo menos compatível ao do desenvolvimento da tecnologia. A discussão sobre o direito ao esquecimento costuma ser vista como um conflito entre os interesses do cidadão e o direito maior da sociedade, de ter acesso a registros de interesse histórico e de poder de se expressar livremente, em síntese: privacidade versus liberdade de expressão.
Por enquanto, discussões sobre a aplicação do dispositivo interessam mais diretamente aos cidadãos europeus, mas a discussão sobre as vantagens e desvantagens desse tipo de regulamentação é cada vez mais relevante no Brasil, onde esses problemas sendo analisando caso a caso pelo judiciário.
Em tempo. Uma das críticas que se faz à Operação Lava Jato é a suposta prática de vazamento seletivo de informações como forma de transformar suspeitas em fatos consumados, para constranger acusados, ou para mobilizar a opinião pública. O fato é que, falsas ou verdadeiras, informações divulgadas na internet se incorporam à biografia e, através do Google, ficam disponíveis para sempre.