Brasileiro pode ter fama de bonzinho, mas o que nossa sociedade gosta mesmo é de briga. Reunião de condomínio de verdade tem que acabar em briga. Discutir o plano da TV a cabo, idem. Se não gostássemos de briga, os tribunais não estariam cheios de processos. São mais de 80 milhões, quase um para cada brasileiro adulto. Isso sem falar nas diferenças que são resolvidas na marra, com fechadas no trânsito, agressões verbais e físicas. No limite, mais de 50 mil pendengas acabam em homicídio no Brasil todos os anos. Um recorde mundial. Isso não pode dar certo. Se quiserem mesmo ganhar, as pessoas precisam aprender a perder.
Não é fácil. Uma parte do problema é estrutural. O Brasil se organizou para brigar, com suas leis ambíguas, sua máquina pública emperrada, como se tudo tivesse sido feito na medida para enfurecer as pessoas e lhes tirar da razão. Já notou o aviso na repartição: “desacatar funcionário público é crime previsto no artigo 331 do Código Penal”. Eles já sabem que vão nos levar à loucura com seus inúmeros formulários e guichês que resistem ao mundo digital.
E os advogados! Eles aprendem na escola que precisam ganhar, são cobrados pelos clientes por suas vitórias e são remunerados pelo êxito, pelo nocaute! Cá entre nós, eles não têm muito repertório: a proposta diante de uma lide geralmente é ganhar o máximo, ou reduzir a perda ao mínimo. Conheci grandes advogados, alguns dos maiores brigões que já vi em ação.
O que me trouxe a essa história foi o acidente da Vale em Brumadinho e como a empresa vem lidando com a situação. Depois dos primeiros acenos humanitários, já pipocam aqui e ali notícias sobre estranhamentos entra a empresa e os familiares das vítimas em relação às indenizações. Tenha a santa paciência! Será que a Vale vai querer briga? Será que além da lama, vai despejar seu poder econômico, seus peritos, advogados e os políticos que ajuda a eleger sobre as pessoas? Sobre essas pessoas?
A Vale tem seus direitos e precisa defendê-los, pois também tem obrigações com seus empregados, acionistas, fornecedores, com pagamento de impostos, etc, etc… Isso não se discute. Porém, cabe à Vale, e somente à Vale, mostrar que é maior do que um síndico enfezado e que é grande demais para brigar com pescadores, sitiantes e famílias desamparadas.
Não é fácil, mas é possível se a vitória for compreendida em perspectiva, como o ganho de todos. Os brigões ficaram para trás nos lugares onde o mundo andou para frente.